4 de abril de 2010 | 20h34
Ethevaldo Siqueira
Talvez seja pretensão, mas tenho a impressão de que este portal do Estadão está começando a mostrar o que será o jornalismo do século 21. Digo isso pensando também noutra instituição, a universidade, que ainda me parece conservadora e preconceituosa diante das grandes inovações e tendências mundiais. Uma dessas tendências é a do conteúdo aberto (open contents), segundo conclui o relatório Horizons, que sintetiza a opinião de 400 cientistas de todo o mundo.
Ao longo da história, não tem sido fácil abrir o conteúdo das ciências, da literatura e das artes em geral e torná-lo acessível a milhões de pessoas. Na Idade Média, o conhecimento mais avançado da humanidade permanecia trancafiado nos mosteiros. A primeira revolução veio com o livro, a partir da invenção da imprensa por Gutenberg, por volta de 1455.
Ao longo de mais de cinco séculos que nos separam da invenção da imprensa, a humanidade tem vivido outras revoluções tecnológicas como a da máquina a vapor, da eletricidade, do rádio, da TV e da internet. Todos esses avanços têm acelerado, de alguma forma o processo de difusão da informação. Mesmo assim, o acesso ao conhecimento continua a enfrentar barreiras inconcebíveis, em especial na universidade, uma instituição que nasceu no século 14, exatamente com a proposta central de universalizar a cultura.
Diversas instituições de renome, no entanto, começam a abrir seus conteúdos de informação e conhecimento, como é o caso, entre outras, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e da Universidade da Califórnia em Berkeley. Em minha visita a esta última, em janeiro, pude testemunhar a experiência mais ousada de abertura do conhecimento a toda a população: todas as aulas, seminários e debates de Berkeley podem ser livremente repetidos pela internet e pela TV por qualquer cidadão.
É claro que, em menor escala, essa abertura já existe em uma centena de universidades em todo o mundo. No Brasil, entretanto, as resistências ainda são muito grandes, ora por razões puramente formais ou burocráticas, ora por simples má vontade ou inércia. Assim, a universidade brasileira permanece segregada, fechada, em sua condição de redoma ou convento intelectual.
Para nossa alegria, entretanto, as novas tecnologias da comunicação e da informação já ultrapassam a fase do uso incipiente, que era o de apenas fazer mais rapidamente e com maior precisão as mesmas coisas que fazíamos no passado, e começam a abrir a possibilidade de realização de conquistas sociais impensáveis até há alguns anos. Com o notável progresso dessas tecnologias, dispomos de ferramentas mais eficientes para esse processo de democratização do conhecimento. Com esse arsenal de novos recursos, podemos ir muito além da simples e romântica visão de uma Universidade Aberta. A cada dia que passa, torna-se mais fácil, mais rápido e mais barato, organizar, processar, armazenar e transmitir milhões de terabytes de informação sistematizada.
Imagine a potencial dos grandes portais já disponíveis sobre saúde e medicina, com conteúdo fornecido pelas melhores universidades, para orientação de cada cidadão. Essa é, aliás, a filosofia do paciente informado que se expande pelo mundo. Vejam o exemplo seguinte: nos EUA, as Universidades de Harvard, MIT, Columbia, Illinois, Berkeley e Stanford se uniram para criar um portal-modelo de saúde destinado ao grande público (http://www.medpedia.com). Visite-o, caro leitor-internauta.
O que revoluciona a educação
Há cerca de um ano, revisitei a Finlândia, para me atualizar sobre esse país que, reconhecidamente, oferece à sua população o melhor padrão educacional do mundo. Esse nível de excelência alcança tanto a universidade, como o ensino nos níveis médio e primário. Tais resultados decorrem, acima de tudo, da qualidade de seus professores, das instalações de suas escolas, da adequação de seus currículos, do número de horas efetivas de aulas e da seriedade dos processos de avaliação da aprendizagem.
Ouvi de um professor de primeiro grau finlandês: “Como educador, sou bem remunerado, sinto-me integrante da classe média, tenho casa própria, automóvel, sei que terei uma aposentadoria decente e que meus filhos poderão estudar nas melhores escolas. Orgulho-me de minha profissão e de meu trabalho. A sociedade me respeita e reconhece o valor de minha contribuição para o futuro das crianças e jovens de meu país.”
Minha maior surpresa na Finlândia foi notar que, ali, as escolas de primeiro grau não revelam nenhuma paixão especial pelo computador ou pela banda larga. É claro que seus educadores consideram esses recursos tecnológicos importantes e mesmo estratégicos para o país como um todo, mas afirmam que eles devem ser utilizados na dose certa, no momento exato e de modo correto.
Um dos exemplos desse uso correto é o curso que a escola de nível médio ministra a garotos e adolescentes na Finlândia e em outros países da Europa, para prepará-los para o uso competente do computador e da internet, fornecendo-lhe, ao final, o certificado chamado computer driving license, por analogia com a carteira de habilitação de motorista. Seria muito bom que as crianças brasileiras dispusessem de cursos periódicos semelhantes.
É claro que muitos pais orientam seus filhos no uso de computadores em casa, mas cuidando para que eles não acessem sites de pornografia, pedofilia ou outros conteúdos inadequados. Essa vigilância é mais rigorosa para garotos entre 5 e 12 anos. Há, no entanto, uma minoria de pais que, como no resto do mundo, abandona totalmente seus filhos aos cuidados da internet, sem se preocupar com os riscos potenciais da rede.
Um laptop por aluno?
Não tenho dúvida de que a maioria das pessoas que defende o projeto de Um Laptop por Criança (OLPC, na sigla em inglês One Laptop Per Child) para o Brasil e outros países emergentes, são pessoas bem-intencionadas e idealistas. A experiência finlandesa mostra, no entanto, que o computador, quando usado rotineiramente em sala de aula, sem critério, não traz nenhum benefício para a aprendizagem. Pelo contrário, prejudica o aproveitamento escolar do aluno.
É claro que muitas escolas poderão oferecer a seus alunos acesso a terminais de computadores de uma rede local, com recursos audiovisuais e didáticos, para o ensino de geografia, história, matemática, física, química, biologia, literatura e outras matérias, a partir de projetos pedagógicos bem concebidos. Nesse sentido, seria útil e desejável que os garotos aprendessem a usar em casa alguns aplicativos para a aprendizagem de certas matérias. Conheço pais que usam o Google Earth para ensinar geografia a seus filhos. Ou para mostrar-lhes a beleza da astronomia com um programa tão atraente quanto o Starry Night (Noite Estrelada). Na escola, esses e muitos outros recursos de software poderiam ser adotados para ilustrar aulas, mas sempre sob estrita orientação do professor.
Esperar que a simples disponibilidade do computador e da internet de banda larga na escola deflagre uma revolução na qualidade do ensino é mais que ingenuidade. Nenhuma ferramenta ou tecnologia tem esse dom mágico. Na verdade, a grande revolução educacional que um país pode realizar é resultado da combinação de um conjunto de fatores tão conhecidos como:
a) investimentos públicos prioritários em educação;
b) melhor formação e atualização do professor;
c) remuneração condigna e a perspectiva de uma carreira atraente ao educador;
d) melhoria constante do ambiente escolar, dando-lhe mais segurança e funcionalidade;
e) especial atenção à saúde e à nutrição dos alunos;
f) atualização permanente dos currículos e do material didático;
g) envolvimento direto da família e da sociedade no problema da educação.
Esse último aspecto me preocupa de modo especial pois a maioria dos pais brasileiros não acompanha de perto a vida deseus filhos na escola, não conhece sequer seus professores, nem sabe o que suas crianças fazem na internet.
(Visite também o site www.telequest.com.br)
Fonte: Jornal Estado de São Paulo
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